quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

ÉTICA E LIVRE - ARBÍTRIO iv


Responsabilidade. Mas poder-se-á objectar, se as pessoas não têm livre - arbítrio, então não são responsáveis pelo que fazem. Nesse caso, como poderemos afirmar que Eric Rudolph, ou seja quem for, é realmente um homem mau?
É natural supor que, se não temos livre - arbítrio, então não somos responsáveis. Alguns filósofos pensam que esta é uma conclusão perturbante que devemos resistir, mas outros consideram-na uma ideia esclarecedora que devemos saudar. Bertrand Russell aceitou esta última perspectiva. Escreveu o seguinte:
Nenhum homem trata um automóvel tolamente como trata outro ser humano. Quando o carro não arranca, ele não atribui o seu comportamento irritante ao pecado. Ele não diz: « És um automóvel perverso e não vou dar-te mais gasolina enquanto não arrancares.» Ele tenta descobrir o que há de errado e consertá-lo.”
Similarmente, pensa Russell, quando uma pessoa se comporta mal, devemos tentar descobrir por que razão isso acontece e lidar com o problema. Há seguramente alguma verdade nesta ideia, o que se nota especialmente quando pensamos na lei criminal e nas causas sociais do crime.
Surpreendentemente, no entanto, a noção de senso comum de responsabilidade revela-se perfeitamente compatível com o Determinismo. Ser responsável, no sentido comum, significa poder prestar contas pelo que se fez – podemos ser censurados quando nos comportámos mal e louvados quando nos comportámos bem. Assim, se somos seres responsáveis, têm de existir algumas condições sob as quais sejamos censuráveis por ter feito algo. Que condições serão essas?
Do ponto de vista do senso comum, parece que há três condições: 1) temos de ter realizado o acto em questão, 2) o acto tem de ser errado em algum sentido e 3) temos de não ter culpa para o ter realizado.
A noção de desculpa é crucial. As desculpas são factos que nos tiram o peso de cima quando fazemos algo de mal. Podemos dizer que foi um acidente, que não sabíamos o que estávamos a fazer ou que nos forçaram a agir dessa forma. Não é possível apresentar uma lista completa de desculpas legítimas, mas algumas das comuns são as seguintes:
- Engano. Por exemplo, quando saímos de casa de uma certa pessoa, levámos o seu chapéu-de-chuva por engano – pensámos que era o nosso. Se tivéssemos levado o chapéu-de-chuva intencionalmente, isso teria sido censurável.
- Acidente. Enquanto estávamos a conduzir de forma segura, tomando todas as precauções razoáveis, uma criança pôs-se subitamente à frente do automóvel – não podíamos ter evitado atropelá-la. Se tivéssemos tentado atropelá-la, ou mesmo se pudéssemos razoavelmente tê-lo evitado, poderíamos ser censurados.
- Coerção. Fomos forçados a abrir o cofre para assaltantes do banco porque eles nos apontaram uma arma à cabeça. Se o tivéssemos aberto voluntariamente, poderíamos ser censurados.
- Ignorância. Demos veneno à nossa mulher com a bebida para tomar ao deitar, mas não sabíamos que era veneno porque as pílulas estavam no frasco dos medicamentos e julgávamos que eram aspirina. Se soubéssemos que eram veneno, seríamos assassinos.
- Insanidade. Sofremos do síndrome de Capgras, uma doença mental rara que faz as pessoas acreditarem que alguém que conhecem – geralmente um amigo ou um familiar – foi substituído por um impostor. Assim, não temos culpa do nosso comportamento objectável. Há muitas outras doenças do género e geralmente acredita-se que resultam de danos em partes específicas do cérebro.

Problemas da Filosofia, James Rachels, Gradiva - (Colecção Filosofia Aberta -pp- 200 -o2)

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