As questões sobre «valores» - isto é, sobre o que é bom ou mau em si, independentemente dos seus efeitos - estão fora do domínio da ciência, como os defensores da religião afirmam veemente. Eu penso que nisto têm razão, mas retiro outra conclusão que eles não retiram - a de que as questões sobre «valores« estão completamente fora do domínio do conhecimento. Por outras palavras, quando afirmamos que isto ou aquilo tem «valor», estamos a exprimir as nossas emoções, e não a indicar algo que seria verdadeiro mesmo que os nossos sentimentos pessoais fossem diferentes. (...)
Qualquer tentativa de persuadir as pessoas de que algo é bom (ou mau) em si, e não apenas por causa dos seus efeitos, depende não de qualquer recurso a provas, mas da arte de suscitar sentimentos. O talento do pregador consiste sempre em criar nos outros emoções semelhantes às suas - ou diferentes, se ele for hipócrita. Ao dizer isto não estou a criticar o pregador, mas a analisar o carácter essencial da sua actividade.
Qualquer tentativa de persuadir as pessoas de que algo é bom (ou mau) em si, e não apenas por causa dos seus efeitos, depende não de qualquer recurso a provas, mas da arte de suscitar sentimentos. O talento do pregador consiste sempre em criar nos outros emoções semelhantes às suas - ou diferentes, se ele for hipócrita. Ao dizer isto não estou a criticar o pregador, mas a analisar o carácter essencial da sua actividade.
Quando um homem diz «Isto é bom em si» parece estar a exprimir uma proposição, como se tivesse dito«Isto é um quadrado» ou «Isto é doce». Julgo que isto é um erro. Penso que aquilo que o homem quer realmente dizer é «Quero que toda a gente deseje isto», ou melhor, «Quem me dera que toda a gente desejasse isto» Se aquilo que ele diz for interpretado como uma proposição, esta é apenas sobre o seu desejo pessoal. Se for antes interpretado num sentido geral, nada afirma, exprimindo apenas um desejo. O desejo, enquanto acontecimento, é pessoal, mas o que se deseja é universal. Penso que foi este curioso entrelaçamento entre o particular e o universal que provocou tanta confusão na ética. (...)
Se esta análise está correcta, a ética não contém quaisquer proposições, sejam elas verdadeiras ou falsas, consistindo em desejos gerais de uma certa espécie, nomeadamente naqueles que dizem respeito aos desejos da humanidade em geral - e dos deuses, dos anjos e dos demónios, se eles existirem. A ciência pode discutir as causas dos desejos e os meios para os realizar, mas não contém quaisquer frases genuinamente éticas, pois esta diz respeito ao que é verdadeiro ou falso.
Bertrand Russell, «Ciência e Ética», 1935, trad. de Paula Mateus, § 10-20
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