quarta-feira, 14 de abril de 2010

ÉTICA E ESTUPIDEZ


É moralmente errado lucrar com os erros ou a estupidez de outras pessoas?

Depende de se estar a lucrar passiva ou activamente. Lucrar passivamente não é, em geral, moralmente errado. Aproveitar-se de é, em geral, moralmente errado, especialmente quando, ao explorar a estupidez de outrem, leva essa pessoa a cometer o erro, ou a laborar em erro (por exemplo, ao levar alguém a aceitar uma aposta impossível de ganhar). As situações em certo sentido menos activas são aquelas em que não desempenhamos qualquer papel na causa do erro, mas em que, ainda assim, o exploramos de algum modo. Isto pode ser errado – como quando apanhamos um maço de notas que alguém deixou cair ao chão e ficamos com ele em vez de tentarmos devolvê-lo a quem o deixou cair. Ou pode não ser errado, em casos menores, como quando ficamos com o troco que encontramos na calha de devolução de moedas de uma cabina telefónica pública.
A situação moral altera-se no contexto de jogos de competição, nos quais lucrar com as circunstâncias é entendido como parte do jogo. Num jogo de competição (xadrez, póquer, boxe) não é errado enganar o adversário levando-o a cometer um erro e depois explorar esse erro o melhor que pudermos e soubermos. O mesmo se aplica à competição entre empresas ou estados. Todavia, existem três restrições a observar: a primeira, podemos explorar os erros do adversário somente na medida em que essa exploração for permitida pelas regras do jogo – não podemos, por exemplo, oferecer ao adversário de xadrez um sonífero que (esperamos) ele confunda com uma drageia de hortelã-pimenta, tal como não podemos valer-nos de um erro do adversário numa competição de luta livre para o asfixiar até à morte; a segunda, a entrada do adversário no jogo tem de ser voluntária, e não uma consequência de o termos aliciado a entrar no jogo explorando a estupidez dele; e a terceira, as regras do jogo têm, elas mesmas, de ser moralmente aceitáveis.

GEORGE, Alexander (org), Que Diria Sócrates, 1ª edição, 2008. Lisboa: Gradiva, pp.79-80

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