Gerry Wallace
Será que os dilemas morais proporcionam uma maneira de escolher teorias morais rivais?
Os dilemas morais parecem oferecer uma maneira de testar duas das teorias morais mais importantes: o utilitarismo e o absolutismo moral. Quando falo de «absolutistas morais» refiro-me àqueles que defendem que há pelo menos uma regra moral simples e que não admite excepções, como «é sempre errado matar pessoas inocentes/quebrar promessas/dizer mentiras, etc.» Os utilitaristas rejeitam regras como estas, defendendo que podem haver circunstâncias em que infringir a regra é a única maneira de minimizar as más consequências, isto é, de evitar um mal maior. Numa forma de dilema muito discutida, um agente moral, A, encontra-se numa situação em que, se matar uma de vinte pessoas inocentes que estão prestes a ser executadas, fará com que as restantes dezanove sejam libertadas. Por outro lado, se A se recusar fazer isso, o seu captor matará todas as vintes pessoas. Chamarei a isto o dilema de Williams, pois Bernard Williams elabora-o e discute-o em Utilitarianism: For and Against (Cambridge University Press, 1973), p. 98.
Tanto os utilitaristas como os absolutistas morais parecem ficar satisfeitos quando discutem este dilema e defendem que o tratamento que lhes dão é mais convincente do que o dos seus oponentes. Para o utilitarista, a discussão proporciona uma oportunidade para mostrar que, mesmo em situações de dilema, o raciocínio moral permanece possível. Pode-se considerar as consequências: não é seguramente melhor que morra um em vez de vinte? Deste modo, defende o utilitarista, por muito difíceis que sejam as circunstâncias podemos chegar a uma resposta ponderada considerando os factos. Por outro lado, segundo o absolutista os dilemas ilustram a natureza simplista do utilitarismo. Certamente os agentes morais sérios agonizam perante uma situação tão trágica como a que o dilema de Williams envolve. No entanto, se acreditarmos no utilitarista, tudo o que estes precisam de fazer é contar cabeças. Não há qualquer razão para agonizar. O absolutista conclui que o utilitarismo não é uma teoria moral para agentes morais sérios, pois não pode acomodar valores morais cruciais, como a justiça e a integridade.
Assim, é fácil ver por que razão a discussão do dilema é atraente tanto para os absolutistas como para os utilitaristas. Ela permite que o absolutista nos faça perceber a complexidade da ética e conclua que é inútil procurar um princípio moral fundamental que permita resolver todos os dilemas morais. O utilitarista, pelo contrário, espera que a superioridade racional do utilitarismo se torne manifesta na discussão. Como pode a morte de vinte ser melhor do que a morte de um? Qual é o interesse de aderirmos a proibições absolutas se, ao fazermos isso, produzimos um resultado pior do que aquele que seria necessário? A «profundidade» do absolutismo não será, afinal, confusão e irracionalidade?
Tradução de Pedro Galvão.
Retirado de Textos de Apoio ao Manual A Arte de Pensar, 10º Ano - Didáctica Editora
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