quarta-feira, 28 de outubro de 2009

O LEGADO DE SÓCRATES iv


A Analogia entre o Estado e os pais


O segundo argumento de Sócrates envolve uma comparação entre a nossa relação com o Estado e a nossa relação com os nossos pais. Os nossos pais tornaram possível a nossa vida - conceberam-nos, criaram-nos e educaram-nos. Temos, portanto, a obrigação de os respeitar e de lhes obedecer. O Estado também torna possível a nossa vida, proporcionando um ambiente social que nos cria e sustenta. Por isso, temos uma obrigação similar de respeitar e de obedecer ao estado. Uma vez mais, Sócrates imagina que «as Leis e a Constituição de Atenas» estão a falar:
« Desde que nasceste e foste criado e educado, poderás negar, para começar, que tanto tu como os teus antecedentes foram nossos filhos e servos?(...) E serás tão sábio que te esqueceste de que, comparado com o teu pai, a tua mãe e todos os teus ascendentes, o teu país é de longe mais preciosos, mais venerável, mais sagrado e considerado mais honroso entre os deuses e todos os homens razoáveis? Não compreendes que tens uma obrigação ainda mais forte de respeitar e de suportar a fúria do teu país do que a fúria do teu pai?»
E assim, Sócrates conclui que tem de acatar o veredicto do tribunal e de beber a cicuta.
Este é um exemplo de um argumento por analogia. Estes argumentos por vezes são sólidos e por vezes não o são. Será que este é sólido? O problema é que a nossa obrigação de obedecer à lei não pode ser como a nossa obrigação de obedecer aos nossos pais, já que, enquanto adultos, não temos a obrigação de obedecer aos nossos pais. Temos de obedecer aos nossos pais quando somos muito novos, porque nessa altura não temos discernimento. À medida que amadurecemos, no entanto, aprendemos a pensar por nós próprios e a nossa relação com eles muda. Embora possamos continuar a dever gratidão e respeito aos nossos pais, já não lhes devemos obediência. Um adulto que ainda «obedece aos seus pais» como se tivesse doze anos é um caso triste. Por issso, este argumento também é fraco.
Até agora, então, não encontrámos qualquer boa razão para pensar que Sócrates tinha de beber a cicuta. Nem o argumento da destruição do Estado, nem o argumento da anologia entre o Estado e os pais, nos compelem a chegar a essa conclusão. Porém, importa considerar outra linha de raciocínio.

Problemas da Filosofia, James Rachels - Gradiva, Colecção Filosofia Aberta. pp 20-21

2 comentários:

Anónimo disse...

Poderia resumir um pouco mais?

Anónimo disse...

Poderia resumir um pouco mais?