Parte II
Objecções ao subjectivismo
A Ana Subjectivista deu-nos uma formulação clara de uma maneira importante de abordar a moral. Concordo com a sua ênfase na liberdade moral e com a sua rejeição do relativismo cultural (e de qualquer outra perspectiva que exclua a liberdade moral). Mas discordo da sua análise do "bem". Além disso, necessita de aprofundar as suas ideias sobre o pensamento moral.
O maior problema consiste no subjectivismo fazer o bem depender completamente do que gostamos. Se "X é um bem" e "Gosto de X" significam a mesma coisa, o seguinte raciocínio é válido:
Gosto de X.
∴ X é um bem.
Suponha por momentos que os amigos irresponsáveis da Ana Subjectivista gostam de se embebedar e magoar pessoas. Poderiam então deduzir que as acções abaixo são um bem:
Gosto de me embebedar e magoar pessoas.
∴ Apanhar bebedeiras e magoar pessoas é um bem.
Mas este raciocínio não está correcto: a conclusão não se segue da premissa. O subjectivismo oferece-nos uma abordagem demasiado imperfeita da moral, em que apenas fazemos o que gostamos.
Pior ainda, os meus gostos e aversões tornariam as coisas boas ou más. Suponha que gosto de magoar pessoas; isto faria com que fosse um bem magoar pessoas. Imagine que eu gosto de reprovar estudantes apenas pelo prazer que isso provoca; isto faria com que reprovar estudantes apenas pelo gozo se tornasse um bem. Tudo o que me agradasse tornar-se-ia um bem – ainda que eu gostar disso fosse apenas o produto da estupidez e da ignorância.
O racismo fornece-nos um bom teste para as perspectivas éticas. O subjectivismo é insatisfatório neste ponto dado afirmar que fazer sofrer pessoas de outras raças é um bem desde que eu goste de o fazer. Depois, o subjectivismo implica que Hitler disse a verdade quando afirmou "O assassínio dos judeus é um bem" (visto que este enunciado apenas significa que Hitler gostava de matar judeus). O subjectivismo tem implicações inaceitáveis sobre o racismo.
A educação moral dá-nos outro teste. Se aceitarmos o subjectivismo, de que modo educaremos as nossas crianças para pensarem sobre questões morais? Ensiná-las-íamos a seguir os seus sentimentos, a deixarem-se guiar pelos seus gostos e aversões; não lhes forneceríamos um guia para formarem sentimentos responsáveis e sensatos. Ensinaríamos às crianças que "Gosto de magoar pessoas – portanto, magoar pessoas é um bem" é uma forma correcta de raciocinar. O subjectivismo implica também consequências bizarras em educação moral.
Não é difícil expor as debilidades do subjectivismo. Mas, nesse caso, por que razão é tão plausível esta doutrina? Uma das razões é que aquilo de que gostamos corresponde, em geral, ao que pensamos ser um bem. O subjectivismo explica isto: dizer que uma coisa é "boa" significa que gostamos dela. Mas é possível dar outras explicações. Talvez estejamos motivados para gostar daquilo que descobrimos ser um bem (através da razão ou da religião). Portanto, não há apenas uma forma de explicar a ligação entre o que gostamos e o que julgamos um bem.
Se, como é frequente, formos pessoas moralmente imaturas, esta correspondência pode falhar. Podemos gostar de coisas que julgamos serem um mal, por exemplo, gostar de magoar as outras pessoas. O que se espera da moral é que sirva de constrangimento aos nossos gostos e aversões. Pensar que magoar outras pessoas é um mal pode impedir-nos de o fazer, embora fosse isso que gostaríamos. Portanto, não podemos identificar o que é bom com aquilo de que gostamos – embora, se tivermos maturidade moral, haja uma correspondência entre ambos.
Não são muitos os filósofos que defendem actualmente o subjectivismo. Alguns dos que têm tendência para o subjectivismo adoptaram o emotivismo, doutrina que difere da primeira de uma forma subtil. Cada uma destas perspectivas interpreta o "bem" como se segue:
Subjectivismo: "X é um bem" significa "Gosto de X"
Emotivismo: "X é um bem" significa "Viva X!"
O emotivismo afirma que os juízos morais são exclamações emocionais e não afirmações verdadeiras ou falsas; esta perspectiva está muito próxima do subjectivismo e é mais difícil de refutar. Outros filósofos com as mesmas tendências adoptaram a perspectiva do observar ideal; a palavra "bem" exprime não os sentimentos que efectivamente temos mas o modo como nos sentiríamos caso fossemos totalmente racionais. Esta perspectiva tenta combinar o sentimento e a razão. A próxima secção é dedicada a esta perspectiva. A Sub falou-nos em liberdade moral. Mas não nos disse de que modo podemos usá-la de uma forma responsável. Disse que precisamos de seguir os nossos sentimentos. Mas nada disse acerca de como desenvolver sentimentos sensatos. A próxima perspectiva procura superar estas deficiências através de uma concepção mais rica acerca daquilo em que consiste o pensamento moral.
Harry Gensler
Retirado de http://www.criticanarede.com/
Objecções ao subjectivismo
A Ana Subjectivista deu-nos uma formulação clara de uma maneira importante de abordar a moral. Concordo com a sua ênfase na liberdade moral e com a sua rejeição do relativismo cultural (e de qualquer outra perspectiva que exclua a liberdade moral). Mas discordo da sua análise do "bem". Além disso, necessita de aprofundar as suas ideias sobre o pensamento moral.
O maior problema consiste no subjectivismo fazer o bem depender completamente do que gostamos. Se "X é um bem" e "Gosto de X" significam a mesma coisa, o seguinte raciocínio é válido:
Gosto de X.
∴ X é um bem.
Suponha por momentos que os amigos irresponsáveis da Ana Subjectivista gostam de se embebedar e magoar pessoas. Poderiam então deduzir que as acções abaixo são um bem:
Gosto de me embebedar e magoar pessoas.
∴ Apanhar bebedeiras e magoar pessoas é um bem.
Mas este raciocínio não está correcto: a conclusão não se segue da premissa. O subjectivismo oferece-nos uma abordagem demasiado imperfeita da moral, em que apenas fazemos o que gostamos.
Pior ainda, os meus gostos e aversões tornariam as coisas boas ou más. Suponha que gosto de magoar pessoas; isto faria com que fosse um bem magoar pessoas. Imagine que eu gosto de reprovar estudantes apenas pelo prazer que isso provoca; isto faria com que reprovar estudantes apenas pelo gozo se tornasse um bem. Tudo o que me agradasse tornar-se-ia um bem – ainda que eu gostar disso fosse apenas o produto da estupidez e da ignorância.
O racismo fornece-nos um bom teste para as perspectivas éticas. O subjectivismo é insatisfatório neste ponto dado afirmar que fazer sofrer pessoas de outras raças é um bem desde que eu goste de o fazer. Depois, o subjectivismo implica que Hitler disse a verdade quando afirmou "O assassínio dos judeus é um bem" (visto que este enunciado apenas significa que Hitler gostava de matar judeus). O subjectivismo tem implicações inaceitáveis sobre o racismo.
A educação moral dá-nos outro teste. Se aceitarmos o subjectivismo, de que modo educaremos as nossas crianças para pensarem sobre questões morais? Ensiná-las-íamos a seguir os seus sentimentos, a deixarem-se guiar pelos seus gostos e aversões; não lhes forneceríamos um guia para formarem sentimentos responsáveis e sensatos. Ensinaríamos às crianças que "Gosto de magoar pessoas – portanto, magoar pessoas é um bem" é uma forma correcta de raciocinar. O subjectivismo implica também consequências bizarras em educação moral.
Não é difícil expor as debilidades do subjectivismo. Mas, nesse caso, por que razão é tão plausível esta doutrina? Uma das razões é que aquilo de que gostamos corresponde, em geral, ao que pensamos ser um bem. O subjectivismo explica isto: dizer que uma coisa é "boa" significa que gostamos dela. Mas é possível dar outras explicações. Talvez estejamos motivados para gostar daquilo que descobrimos ser um bem (através da razão ou da religião). Portanto, não há apenas uma forma de explicar a ligação entre o que gostamos e o que julgamos um bem.
Se, como é frequente, formos pessoas moralmente imaturas, esta correspondência pode falhar. Podemos gostar de coisas que julgamos serem um mal, por exemplo, gostar de magoar as outras pessoas. O que se espera da moral é que sirva de constrangimento aos nossos gostos e aversões. Pensar que magoar outras pessoas é um mal pode impedir-nos de o fazer, embora fosse isso que gostaríamos. Portanto, não podemos identificar o que é bom com aquilo de que gostamos – embora, se tivermos maturidade moral, haja uma correspondência entre ambos.
Não são muitos os filósofos que defendem actualmente o subjectivismo. Alguns dos que têm tendência para o subjectivismo adoptaram o emotivismo, doutrina que difere da primeira de uma forma subtil. Cada uma destas perspectivas interpreta o "bem" como se segue:
Subjectivismo: "X é um bem" significa "Gosto de X"
Emotivismo: "X é um bem" significa "Viva X!"
O emotivismo afirma que os juízos morais são exclamações emocionais e não afirmações verdadeiras ou falsas; esta perspectiva está muito próxima do subjectivismo e é mais difícil de refutar. Outros filósofos com as mesmas tendências adoptaram a perspectiva do observar ideal; a palavra "bem" exprime não os sentimentos que efectivamente temos mas o modo como nos sentiríamos caso fossemos totalmente racionais. Esta perspectiva tenta combinar o sentimento e a razão. A próxima secção é dedicada a esta perspectiva. A Sub falou-nos em liberdade moral. Mas não nos disse de que modo podemos usá-la de uma forma responsável. Disse que precisamos de seguir os nossos sentimentos. Mas nada disse acerca de como desenvolver sentimentos sensatos. A próxima perspectiva procura superar estas deficiências através de uma concepção mais rica acerca daquilo em que consiste o pensamento moral.
Harry Gensler
Retirado de http://www.criticanarede.com/
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