segunda-feira, 24 de novembro de 2008

PERGUNTAS INQUIETANTES

Os próximos períodos serão para a humanidade períodos de decisão em termos de política da espécie. Neles se mostrará se a humanidade ou as suas fracções culturais dominantes conseguirão produzir procedimentos eficazes de autodisciplina. É que a cultura contemporânea é também teatro do combate de titãs entre os impulsos domesticadores e os bestializantes, e os seus correspondentes media. Certamente que, a surgirem quaisquer novos progressos na domesticação seriam outras tantas surpresas, em face de um processo de civilização em que se pôs em marcha uma inusitada e ao que parece imparável vaga desinibitória. Reporto-me aqui à onda de violência que eclodiu nos tempos actuais nas escolas de todo o mundo ocidental, e sobretudo nos EUA, onde os professores começaram a instalar mecanismos de protecção contra os alunos. Tal como o livro, na Antiguidade perdeu na luta contra o teatro, hoje poderá a escola ver-se derrotada antes as potências educativas indirectas, a televisão, o cinema violento, e outros meios desinibitórios, se não surgir uma nova estruturas cultural moderadora de violência.
Em contrapartida, saber se o desenvolvimento a longo prazo levará também a uma reforma das propriedades da espécie, se uma futura antropotecnologia irá ao ponto de pôr em prática um planeamento explícito dos caracteres genéticos, ou se a humanidade como espécie conseguirá passar do fatalismo do nascimento a uma gestação facultativa e à selecção pré-natal – são as perguntas ainda vagas e inquietantes, com que o horizonte da evolução começa a confrontar-nos.
SLOTERDIJK, Peter, Regras para o Parque Humano, 2007. Coimbra: Angelus Novus, Editora, pp. 64-65

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