quarta-feira, 21 de maio de 2008

O que é um problema filosófico?

Contrariamente às interrogações meteorológicas sobre os fenómenos atmosféricos ou às interrogações anatómicas sobre a forma e a estrutura dos organismos, as interrogações filosóficas não dizem respeito a um domínio específico, a um santuário, mas a todas as coisas, mesmo àquelas que em linguagem comum não chamaríamos coisas: as pastilhas elásticas, o infinito, a alegria, as relações, as torradeiras, as dores violentas, a lei da gravitação universal, os bebés, que são suficientemente velhos para morrer desde que nascem, as rosas, que têm espinhos, e a palavra “rosa”, que, enquanto tal, não os tem.
Um problema filosófico, à partida, não é uma interrogação técnica ou esotérica, reservada apenas a especialistas. Mas uma perplexidade de ordem geral que, qual for o tema abordado, não admite uma resposta evidente.
Um problema filosófico é por natureza intrigante: julgamos possuir a resposta; todavia, logo que tentamos formular as razões que justificam aquilo de que estamos persuadidos, apercebemo-nos com espanto, ao mesmo tempo que nos vamos apercebendo dos nossos preconceitos, que somos incapazes de articular uma resposta firme, susceptível de esgotar a questão, e depressa caímos num abismo de perplexidade.
Se a filosofia é mesmo uma actividade que procura compreender as coisas que nos intrigam e que nos dizem respeito, a única maneira de apresentar a filosofia consiste em praticá-la simplesmente.
Uma boa maneira de filosofar consiste em recorrer a “experiências de pensamento”, um método clássico que faz parte do equipamento básico do filósofo; em suma, o seu tubo de ensaio ou uma das chaves da sua caixa de ferramentas. Uma experiência de pensamento é uma situação imaginária extrema que permite ilustrar ou comprovar uma crença metafísica e que, por não sofrer qualquer condicionamento, força o pensamento a ir até ao fundo de si mesmo, até ao extremo dos seus limites. É preciso, no entanto, ter atenção: as experiências de pensamento não são “provas”, e acontece que nem sempre constituem argumentos. Mas o interesse das experiências de pensamento é, ainda assim, bem real: denunciar as nossas ilusões, escapar à caverna das nossas crenças familiares.
FERRET Stéphane, Aprender com as Coisas – uma iniciação à filosofia, 2007. Lisboa: Edições Asa, pp. 8-10

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