quarta-feira, 7 de dezembro de 2016
Conhecimento
sábado, 26 de janeiro de 2013
A tese céptica de Hume acerca da indução
terça-feira, 8 de janeiro de 2013
CONHECIMENTO A PRIORI
sábado, 5 de janeiro de 2013
CONHECIMENTO
sexta-feira, 6 de janeiro de 2012
CONHECIMENTO A PRIORI
domingo, 25 de dezembro de 2011
O que é o conhecimento?
domingo, 19 de abril de 2009
Verdade

A noção de verdade não é uma fantasia mitológica, como os deuses da antiguidade clássica, pois pode-se abandonar as noções mitológicas mas não a noção de verdade. Pode-se abandonar sem pena de incoerência a noção de Zeus porque se pode afirmar que é verdade que Zeus não existe. Mas não se pode abandonar sem pena de incoerência a noção de verdade porque não se pode afirmar que é verdade que a verdade não existe.
Sem verdade não há validade. A validade, no sentido lógico definitivamente estabelecido por Aristóteles, é uma relação entre valores de verdade. Um argumento é válido quando é impossível, ou improvável, que as suas premissas sejam verdadeiras e a sua conclusão falsa. Se não existisse validade, qualquer mau argumento a favor da ideia de que há verdade seria tão bom quanto o melhor argumento contra tal ideia. Isto mostra que a noção de que não há verdade é arbitrária, pois quem a aceita tem de aceitar que há tão boas razões para a aceitar como para a rejeitar.
Sem validade não há argumentação e quando não há argumentação resta a manipulação e a força bruta de quem tem mais força: força física, força económica, força política. Contudo, por mais força política, económica ou física que tenha quem defende que a discriminação das mulheres é uma boa ideia, não poderá apresentar bons argumentos porque a verdade não está do seu lado. A força bruta compra muita coisa, mas não pode comprar a verdade.
A verdade não se submete à força bruta nem à crença forte. Contudo, uma superstição comum é que crer com muita firmeza em algo torna verdadeiro o objecto da crença. Esta superstição baseia-se numa confusão entre as noções de crença e de conhecimento. Quando se sabe realmente algo, o que se sabe é verdade: não é possível saber que Kant morreu em 1803 porque ele não morreu em 1803, apesar de ser possível estar enganado e pensar que se sabe que Kant morreu em 1803. Mas quando se tem uma certa crença, por mais forte que seja, o que se crê pode não ser verdade: é perfeitamente possível crer que Kant morreu em 1803, apesar de na verdade ele ter morrido em 1804. Pensar que a crença forte produz verdades é uma maneira infantil e vã de tentar garantir que os nossos desejos serão realizados se os desejarmos com muita firmeza.
Se a verdade não existisse, não faria sentido exigir responsabilidade pelas nossas crenças, convicções ou opiniões. Exige-se responsabilidade porque podemos estar enganados e podemos estar enganados porque a verdade pode não estar do nosso lado: podemos pensar que sabemos quando não sabemos. O filósofo e matemático britânico W. K. Clifford (1845-1879) defendeu que "é sempre incorrecto, seja onde for e para quem for, acreditar em algo sem provas suficientes" ("A Ética da Crença", 1877). Clifford apresenta o exemplo de um armador que envia o seu velho navio para mais uma longa viagem sem tomar precauções suficientes no que respeita à sua manutenção. Contra todas as evidências, o armador convence-se a si mesmo de que o navio está em condições de fazer uma última viagem, antes de sofrer reparações profundas. E envia o navio para o alto-mar, colocando a sua confiança na Providência. Quando o navio naufraga, morrendo toda a gente a bordo, o armador recolhe o dinheiro do seguro, com toda a paz de espírito. Clifford considera que o armador está em falta: a ética da crença obriga a ter o cuidado de não aceitar uma proposição sem ter suficientes provas a seu favor. O armador continuaria em falta mesmo que o navio não tivesse naufragado — porque ele tinha razões para acreditar que o navio corria um sério risco de naufragar, tendo activamente bloqueado tal crença só porque lhe era incómoda.
sábado, 12 de julho de 2008
O “SER” DAS COISAS

Vergílio Ferreira
SARTRE, Jean-Paul; FERREIRA, Vergílio, O Existencialismo é um Humanismo, 2004. Lisboa: Bertrand Editora, pp. 24-25
quinta-feira, 29 de maio de 2008
ACÇÕES DE BASE
É possível agora definir a acção de base. O conceito é introduzido por um argumento puramente lógico, e não por uma descrição fenomenológica. Nenhuma acção se identifica como pertencente intrinsecamente à base. O argumento é da forma: se algo se faz através de outra coisa distinta, então deve haver uma acção que se faz pura e simplesmente. De outro modo, nada se faria. Este argumento que requer uma análise acabada, funda-se na impossibilidade da regressão até ao infinito; “de base” significa apenas: que não se faz através de outra coisa. Do ponto de vista fenomenológico, a mesma acção poderá ser de base num caso (deslocar uma pedra empurrando), mas não noutro caso (fazer que o braço seja puxado por alguém). Além disso pode chegar-se à noção de acção de base a partir de outros tipos de acções distintos das acções mediatas, por exemplo, as acções “compósitas” (a dança) e as acções interpretadas” (é o caso do gesto de bênção antes evocado, que não é uma acção mediata, mas um “gesto”, isto é, uma acção feita em conformidade com uma regra: redescrever o mesmo gesto em descrições diferentes não é referi-lo a uma acção mediata). Mas nos três casos (acção “mediata”, acção “compósita” e “gesto”), o mesmo argumento regressivo isola a acção de base.
O carácter lógico e não fenomenológico do argumento explica-se pelo paralelismo com o conhecimento: todo o conhecimento mediato remete para um conhecimento imediato ou directo. Aí está o primeiro lugar do argumento regressivo: m crê que e porque percebe o que torna verdadeiro e. Creio que existe aqui um pedaço de papel porque o vejo. A transferência do conhecimento para a acção apoia-se no paralelismo entre o objecto e o evento, entre ser verdadeiro e tornar verdadeiro.
O estatuto da acção de base é paralelo ao das cognições de base; a cognição de base é o que transpõe o abismo lógico entre a asserção e o sentido: creio-o porque vejo, da mesma forma: isto acontece porque o faço. O recobrimento de um evento por um fazer é semelhante ao recobrimento de um ver por um crer.
Pode conceber-se, pelo menos teoricamente, que a mesma expressão “m ri-se” pertence a quatro configurações de sentido de que só uma, a quarta, é uma acção de base. Primeiro caso: m faz-se rir, por exemplo, ao fazer algo de ridículo, ou ao aspirar deliberadamente um gás hilariante; rir é a acção do agente, mas ele fê-la acontecer ao fazer outra coisa. Segundo caso: alguém faz rir m; outrem diferente do agente faz que m se ria. Terceiro caso: o dos tiques: o riso é um sintoma como o soluço. Não é de modo algum uma acção. Quarto caso: em contrapartida, rir é uma acção de base se m se ri quando tem vontade; diz-se então que tem o poder para isso.
RICOEUR, Paul, O Discurso da Acção, 1ª edição, 1988. Lisboa: Edições 70, pp. 37-39
CONHECIMENTO E ACÇÃO
Mas a distinção principal é a que permite isolar as acções de “base” das acções “mediatas” que sobre elas se edificam. Assim como se conhece algo através de alguma coisa que se conhece directamente, assim também se faz acontecer alguma coisa (mover uma pedra) por meio de uma outra coisa que se faz simplesmente e que desempenha em relação à primeira acção o mesmo papel que a evidência.
Ora, a arquitectura do mediato e do imediato é muito mais fácil de discernir na ordem do conhecer do que na do agir: um homem (m) conhece que s se se satisfazerem três condições: m crê que s (condição representativa), s é verdadeiro (condição semântica), m tem uma prova material (condição explicativa). Esta terceira condição contém a diferença entre conhecimento mediato e imediato: conhecer algo (s) porque se conhece (e) (evidência).
As condições paralelas às do modelo cognitivo são então: m tem a intenção de que a suceda (condição representativa); a acontece (condição semântica); ao fazer b, b é adequado para a (condição explicativa). O paralelismo exprime-se no vocabulário: “através de”, “porque”…, que, por ambos os lados, exclui a relação fortuita e requer a concatenação da explicação. A única diferença entre crença racional e acção racional consiste na inversão do paralelismo: por um lado, explica-se a crença pela evidência; por outro, explica-se o acontecimento pela intenção. Num caso, ligamos as nossas representações às coisas; no outro, as coisas às nossas representações.
RICOEUR, Paul, O Discurso da Acção, 1ª edição, 1988. Lisboa: Edições 70, pp.35-36
sexta-feira, 23 de maio de 2008
E SE FÔSSEMOS UM CÉREBRO NUMA CUBA?
Imagine uma situação em que as coisas que vê não correspondem a objectos tridimensionais, onde não existe, não obstante a sua crença irresistível, nenhum mundo físico mobilado de coisas tangíveis, como o Sol, como as rãs verdes ou as escovas de dentes. Imagine, por exemplo, que é um cérebro flutuando numa cuba. Não um cérebro morto num frasco de formol, mas um cérebro mantido em estado de funcionamento, graças a uma solução química. Um cientista louco extraiu-lhe o cérebro da caixa craniana sem o seu conhecimento, e o resto do corpo foi incinerado. Para lhe criar a ilusão de que nada mudou, o cientista louco ligou o seu cérebro a um computador que lhe envia impulsos eléctricos via eléctrodos ligados às suas terminações nervosas, que o seu cérebro, como se nada se passasse, se apressa a traduzir em imagens, sons, odores, impressões tácteis e gustativas. O processo é interactivo, você tem, a impressão de poder continuar a agir sobre o mundo. Do seu ponto de vista, continua a ter a mesma vida, as suas actividades e percepções são as mesmas, sem que nada destas actividades e percepções corresponda à realidade, no sentido que habitualmente damos a esta palavra. Poderá ir dar uma volta, se assim o desejar, regar as plantas, dar de comer ao gato, aproveitar as férias para se banhar na água azul, de bronzear-se enquanto lê, bem instalado num transatlântico, um chapéu de palha na cabeça e o corpo besuntado de creme, uma obra filosófica contemporânea que descreve a hipótese de um cérebro numa cuba. O supercomputador-prótese funciona às mil maravilhas: você é mais um homem entre os homens, pelo menos um ser vivo, uma coisa do mundo entre as coisas do mundo.
Os filósofos intrigaram-se muitas vezes com este género de hipóteses, mas só um número reduzido, salvo a categoria singular dos cépticos, o levou muito a sério. Semelhantes ficções derivariam de uma patologia ou de uma nevrose tipicamente filosófica, com um remédio muito simples: bastaria formular um raciocínio convincente que permitisse fazer calar o insensato que as exprime e levar os homens de boa vontade a encontrar, espírito apaziguado, o bom velho realismo tradicional, próximo do senso comum.
FERRET, Stéphane, Aprender com as Coisas – uma iniciação à filosofia, 1ª edição, 2007. Lisboa: Edições Asa, pp. 17-18