Pode pensar-se que a lógica
não tem qualquer interesse para a filosofia por ser “meramente formal”. Um
argumento pode ser válido, poderá alguém argumentar, mas isso não garante que a
conclusão seja verdadeira. Como o que interessa à filosofia são as conclusões
verdadeiras, a lógica não tem qualquer interesse, diria essa pessoa.
A resposta a este argumento
é chamar a atenção para duas coisas. Em primeiro lugar, como veremos, nem toda
a lógica é “meramente formal”. A lógica informal, precisamente, não é formal. A
lógica informal estuda muitos aspectos da argumentação que não são estudados pela
lógica formal. Todavia, não é possível dominar a lógica informal sem dominar os
aspectos elementares da lógica formal. A lógica formal é o alicerce a partir do
qual se pode erguer a lógica informal.
Em segundo lugar, o
argumento ignora que as conclusões verdadeiras ou plausíveis
Devem ser justificadas e as
suas consequências explicitadas. O papel da lógica na filosofia torna-se
manifesto quando se compreende que os filósofos procuram, implícita ou
explicitamente, bons argumentos para defender as suas ideias. Mas para que um
argumento seja bom é necessário que seja válido. E é a lógica que ajuda a
determinar se um dado argumento é ou não válido.
CLARIFICAÇÃO
E VALIDADE
A lógica desempenha dois
papéis na filosofia: clarifica o pensamento e ajuda a evitar eros de raciocínio.
A filosofia ocupa-se de um conjunto de problemas. Os filósofos, ao longo da
história, têm dado reposta a esses problemas, tentando solucioná-los. Para isso
apresentam teorias e argumentos. A lógica permite assumir uma posição crítica
perante os problemas, as teorias e os argumentos da filosofia:
1.
A lógica permite avaliar criticamente os
problemas da filosofia. Se alguém quiser reflectir sobre o problema de saber
por que razão a cor azul dos átomos verdes é tão estridente, o melhor a fazer é
mostrar que se trata de um falso problema. Por isso são necessários bons
argumentos; não basta afirmar que se trata de um falso problema.
2.
A lógica permite avaliar criticamente as
teorias dois filósofos. Será que uma dada teoria é plausível? Como poderemos
defendê-la? Quais são os seus pontos fracos e quais são os seus pontos fortes?
E porquê?
3.
A lógica permite avaliar criticamente os
argumentos dos filósofos. São esses argumentos bons? Ou são erros subtis de
raciocínio? Ou baseiam-se em premissas tão discutíveis quanto as suas conclusões?
A lógica representa para a
filosofia o que o laboratório representa para o cientista empírico: é o palco
onde as ideias se testam e avaliam criticamente. Sem esta atitude crítica não
há atitude filosófica. Logo, sem lógica não pode haver uma verdadeira atitude
filosófica.
Alguns filósofos não
apresentam muitos argumentos. Manifestam apenas as suas ideias inspiradas e
visões criativas do mundo. Mas o objectivo do estudo da filosofia não é
aprender a repetir acriticamente essas ideias. O objectivo do estudo da
filosofia é saber discutir essas ideias. Ora, não é possível discutir as ideias
dos filósofos e adoptar uma posição crítica sem dispor dos instrumentos lógicos
adequados. Pois discutir ideias é considerar os argumentos que se podem avançar
a favor dessas ideias e compará-los com os argumentos que se podem avançar
contra elas. E, como é evidente, para comparar a solidez dos diferentes
argumentos, a favor e contra uma dada ideia, é necessário dominar a lógica,
formal e informal.
MURCHO, Desidério, O
Lugar da Lógica na Filosofia, 2003. Lisboa: Plátano Editora, pp. 27-28
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