A filosofia é
diferente de muitas outras disciplinas das Letras porque para estudar filosofia
é necessário fazer filosofia. Para ser um historiador de arte, não é necessário
pintar; para estudar poesia, não é necessário ser um poeta; e podemos estudar
música sem tocar um instrumento. Contudo, para estudar filosofia é necessário
que nos entreguemos à argumentação filosófica (argumentar é apresentar
razões ou indícios que conduzem a uma conclusão). Não se trata de operar ao
nível dos grandes filósofos do passado; mas quando se estuda filosofia faz-se o
mesmo tipo de coisa que eles fizeram. Podemos jogar futebol sem chegar ao nível
do Pelé, e podemos obter muita satisfação intelectual filosofando sem a
originalidade ou o brilhantismo de Wittgenstein. Mas em ambos os casos será
necessário desenvolver algumas das competências usadas pelos grandes praticantes.
Essa é uma das razões pelas quais a filosofia pode ser uma área de estudos
imensamente compensadora.
A palavra "filosofia" deriva do grego "amor da
sabedoria". Mas isto não é particularmente útil para a compreensão do modo
como a palavra é agora usada. A filosofia é uma disciplina nuclear
relativamente à maior parte dos cursos de humanidades. Centra-se em questões
abstractas como "Será que Deus existe?", "Será o mundo realmente
como nos parece que é?", "Como devemos viver?", "O que é a
arte?", "Teremos uma liberdade de escolha genuína?", "O que
é a mente?", e assim por diante.
Estas questões muito abstractas podem surgir na nossa experiência
quotidiana. Algumas pessoas fazem uma caricatura da filosofia como se fosse uma
disciplina sem relevância para a vida, uma disciplina para estudar em casa
unicamente por satisfação intelectual, o equivalente académico de fazer
palavras cruzadas. Mas isto é uma representação gravemente errada de grande
parte da disciplina. Por exemplo, o caloroso debate sobre se o boxe deve ser
proibido só pode responder-se enfrentando questões abstractas importantes.
Quais são os limites aceitáveis da liberdade individual num país civilizado?
Quais são as justificações para o paternalismo, para forçar as pessoas a
comportar-se de uma certa forma para o seu próprio bem? Por outras palavras,
este debate não é apenas sobre reacções emocionais ao boxe; depende antes de pressupostos
filosóficos fundamentais (um pressuposto é uma afirmação a favor da qual não se
avança qualquer argumento; uma afirmação que se aceita para permitir a
argumentação).
A análise de razões e argumentos é uma área própria da filosofia.
De facto, se a filosofia tem um método distintivo, é este: a construção,
crítica e análise de argumentos. As competências filosóficas são aplicáveis em
qualquer área em que os argumentos sejam importantes, e não apenas nos domínios
da especulação abstracta. São particularmente úteis quando se escreve ensaios,
dado que se espera habitualmente que se defenda conclusões, e não apenas que as
afirmemos. Por esta razão, uma formação básica em filosofia é extremamente
importante, seja qual for a disciplina académica que se tenha em mente seguir.
Nigel Warburton
Tradução de Desidério Murcho
Original: http://www.open.ac.uk/Arts/philos/whatis.html
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